Na penteadeira
Eu a via através do espelho de aumento. Olhos esbugalhados, órbitas em evidência. Ela passava rímel e cada cílio disparava uma frase. “Antes de botar pra dormir, tem que escovar os dentes, colocar o pijama…”.
Cheiro de alho saindo pela boca, “…Mas antes pergunta se não quer comer nada”. Quando eu cheguei ela ainda engolia às pressas um prato de macarrão. Falava sem parar. Andava pela casa, catava lenços largados, sapatos pelos cantos, casacos pendurados. A casa, uma bagunça só. Com certeza é a cara dela esta desordem.
Será que não vai passar nem um perfuminho pra disfarçar esse fedor de alho?
Esta pelo menos acertou chegar sem eu ter que rebocar da esquina. Porque muitas não conseguem nem achar o prédio. Acham que o número 26 de um lado da rua tem que estar bem na frentinha do 27 e desistem depois de verem que o 26 tá de cara com o 34… Mas esta não, nível bom, nível bom. Formada ainda por cima. Deve ter se apavorado com o meu jeito e o meu bafo de alho. Foda-se. Tô pagando e caro por hora pra ficar mais da metade do tempo vendo tv ou dormindo. Ainda bem que dei bastante coisa pra ela fazer. Dar banho nos “pintos“, fazer mingau, mixto quente, nescau, botar pijama, escovar os dentes, ler estorinhas, botar pra dormir. Cê pensa que é mole, fofa? Filho é ralação. Esta então que veio “trazida”não sabe ainda o que é ralar no velho mundo. Ainda não mergulhou na água gelada da realidade alpina. Já chega com um teto sobre a cabeça e o aquecedor ligado…
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