Casamento do meu irmão, hoje. É impressionante perceber, hoje, como a vida se encaixa. A nossa vida que nasceu desencaixada. Hoje, comemoramos o casamento que, para alguns, é, no mínimo, um desencaixe. Para nós, filhos do desencaixe, é um dos acontecimentos mais encaixados do mundo. O desencaixe aconteceu com a morte do nosso pai. Uma vida toda planejada no encaixe – até que a morte súbita dele provocou o desencaixe de seus filhos e mulher. Crescemos no desencaixe e fomos felizes nele. Países, objetivos, pessoas, sonhos, tudo desencaixado. A beleza do desencaixe, a agonia dos desencaixados, deliciosos riscos, fomos vivendo. Vivendo sem saber que buscávamos nosso encaixe, só nosso. Sem receitas prontas. E, hoje, olhando a vida do meu irmão, o trajeto feito até aqui, agora, os desencaixes vividos, gozados e sofridos, tudo faz sentido. Como se, agora, os desencaixes, que pareciam enigmas, se esclarecem como céu azul varrendo nuvens. Uma congruência tão óbvia de tempo e espaço que é impossível explicar a lógica do acaso. Do acaso Viena, do acaso hoje, e não ontem, do acaso desse cabelo ruivo longo, e não qualquer outro, do acaso constelação familiar, essa, e não outra qualquer chorando lágrimas polpudas, descendo em corpo robusto, encaixando suas mãos rechonchudas nas mãos do meu irmão. A outra mão ele tem enrolada na do cara de longo cabelo ruivo, esse ruivo, e não qualquer outro. Totalmente alheios ao desencaixe ao redor, eles, subversivamente, se entregam ao encaixe. Deles, só deles. Merecidamente deles.